Obstrução Intestinal em Jejuno: Aspectos Anatômicos, Diagnóstico e Implicações Cirúrgicas

Introdução

A obstrução intestinal é uma condição clínica comum em pequenos animais, especialmente em cães e gatos, podendo ocorrer em qualquer segmento do trato gastrointestinal. Quando localizada no jejuno, a obstrução pode ter causas variadas, incluindo corpos estranhos, intussuscepção, aderências ou neoplasias. O jejuno, como parte do intestino delgado, desempenha um papel essencial na digestão e absorção de nutrientes, e qualquer interrupção nesse processo pode levar a complicações metabólicas e hemodinâmicas graves.


Anatomia do Jejuno e sua Importância na Obstrução

O jejuno é a porção intermediária do intestino delgado e representa a maior parte desse segmento. Situado entre o duodeno e o íleo, possui uma estrutura histológica adaptada para a absorção de nutrientes, com vilosidades intestinais longas e uma densa rede vascular proveniente das artérias jejunais, ramos da artéria mesentérica cranial.

A movimentação do conteúdo intestinal no jejuno ocorre por meio de contrações segmentares e peristálticas, que facilitam a digestão e o trânsito adequado dos alimentos. Alterações nesse trânsito, como na obstrução mecânica, levam a um acúmulo de líquido e gás proximalmente à obstrução, resultando em distensão, isquemia e, potencialmente, necrose da mucosa.

Os estímulos dolorosos provenientes das vísceras podem ser desencadeados por uma intensa dilatação ou contração de um órgão, processos inflamatórios ou pela redução do fluxo sanguíneo (isquemia). Por isso, é comum que as alterações no trânsito gastrointestinal resultantes de uma obstrução causem dor no paciente.


Causas e Tipos de Obstrução Intestinal em Jejuno

A obstrução jejunal pode ser classificada como parcial ou completa e pode ocorrer devido a diferentes fatores:

  1. Corpos Estranhos: Cães e gatos frequentemente ingerem objetos que podem causar bloqueio no lúmen intestinal como brinquedos, elásticos, ossos e tecidos. Objetos lineares, como fios ou fitas, podem levar a uma obstrução em “sanfona” e esse tipo específico de corpo estranho é conhecido como corpo estranho linear.
  2. Intussuscepção: Essa condição ocorre quando um segmento do intestino se invagina dentro de outro, obstruindo o fluxo de conteúdo. É mais comum em cães e normalmente em animais filhotes.
  3. Neoplasias: Tumores intestinais podem crescer dentro do lúmen ou provocar compressão externa, resultando em obstrução progressiva.
  4. Vólvulos e Estrangulamentos: Torção do intestino delgado ao redor de uma aderência ou do próprio eixo mesentérico pode comprometer o suprimento sanguíneo levando à necrose intestinal e peritonite.

Manifestações Clínicas e Diagnóstico

Os sinais clínicos de obstrução em jejuno variam conforme o grau da obstrução e a sua duração. Nos casos agudos, os animais podem apresentar:

  • Vômitos frequentes (frequentemente biliosos)
  • Letargia e anorexia
  • Dor abdominal intensa
  • Distensão abdominal
  • Diarreia (em obstruções parciais) ou ausência de evacuação (em obstruções completas)
  • Desidratação progressiva

O diagnóstico baseia-se em exame clínico e exames de imagem:

  • Radiografia abdominal: Demonstra dilatação das alças intestinais com padrão anormal de acúmulo de gás e, dependendo da causa da obstrução, pode ser observada no exame.
  • Ultrassonografia abdominal: Ajuda a identificar a localização da obstrução e a diferenciar causas como intussuscepção e neoplasia.

Aspectos Anatômicos Importantes e Implicações Cirúrgicas

O tratamento cirúrgico é a principal abordagem para obstruções mecânicas completas e alguns casos de obstrução parcial que não respondem ao manejo clínico. O procedimento adotado varia conforme a causa e a gravidade da obstrução: se houver necrose do tecido intestinal, a retirada da porção acometida é essencial para o sucesso do tratamento. Caso não exista comprometimento da integridade intestinal, a cirurgia de enterotomia é indicada para remoção do corpo estranho.

O jejuno é a porção mais longa e móvel do intestino delgado, o que facilita a abordagem cirúrgica. Sua alta mobilidade, devido ao longo mesentério e à fixação menos rígida em comparação com o duodeno, permite uma manipulação mais segura durante a enterotomia. Além disso, essa característica possibilita a exteriorização da alça intestinal fora da cavidade abdominal, reduzindo a contaminação peritoneal.

Embora uma ressecção de um segmento jejunal possa ser realizada, uma grande remoção desse intestino (mais de 70% do intestino delgado) pode resultar em síndrome do intestino curto, levando a uma absorção deficiente de nutrientes e resultando em sintomas como perda de peso e diarréia. Dessa forma, o cirurgião deve priorizar a preservação do máximo possível de alças intestinais viáveis.

Pacientes submetidos a enterotomias isoladas, sem remoção extensa de jejuno, geralmente apresentam boa recuperação e retomam a função intestinal normal. No entanto, quando há necessidade de ressecção intestinal significativa, pode haver alterações digestivas que exijam ajustes dietéticos e suplementação nutricional para garantir a absorção adequada de nutrientes.


Conclusão

A obstrução intestinal em jejuno exige uma abordagem diagnóstica ágil e precisa. O conhecimento anatômico detalhado do intestino delgado, aliado à identificação precoce da obstrução e à escolha do procedimento cirúrgico mais adequado é essencial para garantir o sucesso terapêutico. 


Referências Bibliográficas

  • FOSSUM, T. W. Cirurgia de Pequenos Animais. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015.
  • ORSINI, J. A.; GRENAGER, N. S.; LAHUNTA, A. de. Comparative Veterinary Anatomy: A Clinical Approach. 1. ed. Elsevier, 2022.
  • KLEIN BG. Cunningham Tratado de Fisiologia Veterinária, 5ª ed., Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

Artigos relacionados

Respostas

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *